15/03/2011 13:14

O valor da retórica na atualidade

 

Por Caíque Alves

A retórica vem sendo usada há muito e muito tempo. Inicialmente ela estava muito ligada aos sofistas, pensadores da Grécia, contemporâneos de renomados filósofos, como Sócrates, Platão e Aristóteles. Dentre os sofistas, mais importantes estão: Protágoras de Abdera, Górgias de Leontini, Pródicos de Quios, Hípias de Élis, Antífon de Ramnonte, Trasímaco de Calcedônia, Cálicles de Acarnânia, Crítias de Atenas (é importante ressaltar que este era primo de Platão, e era um dos trinta tiranos que governaram Atenas depois da guerra de Peloponesco, em 404 a.C.) e por fim Eutidemo e Dionisodoro de Quios.

Importante é ressaltar que os sofistas, justamente pelo uso da retórica não tinham boa fama na sua própria época, e ainda deixam muita gente intrigada. Aqui está uma análise do que se pensava dos sofistas no seu tempo, feita por um historiador:

Impostores ostensivos, adulando e ludibriando a juventude rica em benefício próprio, solapando a moralidade pública e privada de Atenas e encorajando seus discípulos na busca inescrupulosa de ambição e cupidez. Dizem até que conseguiram corromper a moralidade geral, de modo que Atenas se tornou miseravelmente degenerada e viciosa nos últimos anos da guerra do Peloponeso, em comparação com o que era no tempo de Milcíades e Aristides.[1]

 

Para os sofistas, a retórica abrange o conjunto das artes, às quais mantém sob si, com autoridade; por isso, acreditavam poder discursar com eloqüência sobre todo e qualquer assunto que seja tratado, saindo vencedores de qualquer batalha que se dê por meio dos discursos.

Acreditavam também poder transmitir esta técnica chamada retórica a outrem, formando assim novas escolas, diferentes das escolas antigas, por ensinar o que de fato era usado na polis como nos diz Marilena Chaui:

 

Para dar aos jovens essa educação, substituindo a educação antiga dos poetas, surgiram, na Grécia os sofistas, que são os primeiros filósofos do período socrático [...] diziam que os ensinamentos dos filósofos cosmologistas estavam repletos de erros e contradições e que não tinham utilidade para a vida da polis. Apresentavam-se como mestres de oratória ou de retórica, afirmando ser possível ensinar aos jovens tal arte para que fossem bons cidadãos.[2]

 

Os sofistas tinham fama de serem bons oradores, e por isso sempre eram solicitados para a defesa dos acusados nos tribunais da cidade. Eles, na maioria das vezes, conseguiam convencer os juízes de que os seus defendidos é que eram os defensores da verdade no caso, e que a outra parte era defensora da mentira.

Quando tanto acusador quanto acusado escolhiam sofistas para a apologia de suas idéias perante os juízes, vencia quem melhor conseguisse dominar a situação e mostrar melhores argumentos do que o adversário, refutando-o e convencendo os juízes.

Hoje em dia, a coisa não se dá de forma muito diferente. Mudamos os nomes, as profissões e as leis da sociedade, embora a maior parte seja de forma bem próxima da antiga. Os advogados, de defesa e de acusação, travam um combate redundante de idéias distintas entre si, às quais o outro deve contestar, mostrando a sua forma, com o risco de se não o conseguir, perder a causa.

Em suma, ganha a parte que apresentar maior coerência e coesão na sua explanação, conseguindo assim, persuadir o júri ou o juiz, dependendo da forma que seja julgado o caso.

Aplica-se também na nossa sociedade esta forma de “ludibriação”, na política, quando os candidatos – em comícios e/ou visitas – tentam persuadir a população de que podem ser melhores representantes da mesma, exercendo um mandato no poder executivo ou no poder legislativo.

 Mas como é de práxis ocorrer no nosso país as brigas entre legendas partidárias, alguns candidatos não se contentam em somente mostrar em que pode favorecer o município, o estado ou a nação, mas tentam primeiramente, maldizer os oponentes, mostrando ao eleitor que só existe uma opção digna de voto, que, a saber, é ele próprio.

A retórica, entendendo-a como uma forma de discursar, onde tenta-se convencer a outrem de que a sua proposição é verdadeira, é um bem, podemos encontrar a retórica em qualquer discurso de qualquer orador, sabendo este da sua existência ou não dentro da sua oração.

Mas ela também pode ser usada para o mal, para enganar, para ludibriar, para iludir, para trapacear, para fraudar, para lograr, para confundir a população de determinada região.

No dia-a-dia de nosso viver somos todos egrégios sofistas, manipuladores das palavras segundo a gramática, a retórica e a dialética das nossas convivências. Indivíduos e grupos estamos bem pouco no interesse da ordem humana justa e verdadeira. Estamos muito na ordem de interesses particulares. Usamos as palavras para sublimar a sensatez dessa ordem. Nem mais nos damos conta de que ela é uma terrível cama de Procusto, onde muitos são sacrificados. Toda ordem social é cama de Procusto! Sobretudo esta que está ali, a ordem nacional e a ordem internacional.[3]

 

O filósofo Sócrates pode ser um exemplo claro de que ela pode ser usada para o bem, quando a usa para tentar ajudar ao próximo, para tentar mostrar a ignorância em que a pessoa vive.

Há tantas pessoas fazendo discursos neste momento sobre o bem no mundo inteiro, mas a sociedade só quer saber do mal, daquilo que engana, que escarnece o outro, e este é um grande mal que existe nela, pois ao invés de pensar no bem comum, só visa o bem particular.

Se o supracitado Sócrates vivesse no mundo de hoje, estaria decepcionado com a raça humana, pois no seu ponto de vista o homem só quer o bem comum; só faz o mal pelo fato de não ter conhecimento de que é mal, o homem tem a natureza boa.

O homem está envolto em ideologias; vejamos o que nos diz disto o autor Arcângelo R. Bozzi:

A sofística continua. Só mudou de nome. Ela hoje se chama ideologia. E se devêssemos gravar, em coluna de pedra, a palavra que mais comanda o moderno, teríamos que escolher, ao invés de “sofista”, a palavra “ideólogo”.[4]

 

 Por fim, imaginamos estarmos acomodados, cada um com a sua ideologia em mãos, achando que faz dela o que quiser, quando o que acontece é o absoluto contrário, lembrando um verso que se eternizou no cantor Cazuza: “Ideologia, eu quero uma pra viver”, pois não conseguimos viver sem estarmos enganados frente aos problemas da realidade, e então criamos a nossa própria.

 


[1] Esta citação é do historiador GROTE, e se encontra no livro KERFERD, G. B. O Movimento Sofista. Loyola. São Paulo, SP. 2003. p16.

[2] CHAUI, Marilena. Convite à Filosofia. Ática. São Paulo. 13 edição. p40.

[3] BUZZI. Arcângelo R. Introdução ao Pensar – O Ser, o Conhecimento, a Linguagem. Vozes. Petrópolis, RJ. 31 edição. p137.

[4] Idem, p138.

 

 

 

BIBLIOGRAFIA

 

BUZZI. Arcângelo R. Introdução ao Pensar – O Ser, o Conhecimento, a Linguagem. Vozes. Petrópolis, RJ. 31 edição. 1972. 260p.

 

CHAUI, Marilena. Convite à Filosofia. Ática. São Paulo, SP. 13 edição. 2003. 422p.

 

KERFERD, G. B. O Movimento Sofista. Loyola. São Paulo, SP. 2003. 310p.

 

PLATÃO. Górgias, Internet.

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